Não sei como ousas fingir não ouvir os gritos da rua
Não sei como supostas o barulho na porta da tua casa sem se
incomodar
Juro,
Não sei como tapas os olhos para os gemidos de fome na casa
ao lado,
Tu sabes que aquele menino magrelo foi pra escola tendo como
almoço apenas duas bolachas Maria
E isso não te tira a indiferença.
Teu colega acaba de ficar desempregado
Tu não se perguntou como ele fará para sustentar a família.
O preço da cesta básica aumentou novamente,
Mas o seu dinheiro ainda consegue bancar suas despesas
E não se preocupas com a vizinha que teve que diminuir a
quantidade de arroz na compra do mês.
Na noite passada, teve uma chacina na comunidade
- Menos sete bandidos na rua – foi a sua fala
Vai à igreja louvar o Deus da Vida
Mas aplaude o assassinato de seus semelhantes.
Se estressou porque a diarista não foi trabalhar hoje
Mas não se espantou quando soube que ela está esperando por
uma cirurgia há mais de três anos,
Ah, hoje ela não veio porque morreu no corredor de emergência
de um hospital superlotado,
Eu sei isso não te comove em nada,
O que está lhe preocupando é como irá arrumar alguém tão
competente como a finada.
Antes eu pensava que era cegueira
Ou algum tipo de surdez
Que te impossibilitava reagir à tanta dor a seu redor
Mas não,
És a imparcialidade dizendo amém aos opressores
És a ignorância odiando o debate da política,
És a exploração que mata os trabalhadores
És o capital se realizando plenamente.